Escrito por: CNM CUT
Um geólogo carioca radicado em Minas e que construiu quase toda sua carreira na Vale do Rio Doce irá comandar, de Londres, a 'quarta maior mineradora de ferro do mundo'.
A empresa não é conhecida, não está listada em bolsa nem tem um nome específico, mas carrega o pedigree de um dos principais conglomerados mundiais.
A partir de janeiro, José Francisco Martins Viveiros será o principal executivo (CEO Mining) da área de minério de ferro e carvão da Arcelor Mittal, gigante do aço formatada este ano pelo empresário indiano Lakshmi Mittal.
Viveiros, cujo contratação será oficializada nos próximos dias, tem pela frente a missão de ampliar esse negócio, considerado estratégico no suprimento das usinas do grupo. O objetivo é reforçar a auto-suficiência para deixar o grupo o menos dependente possível das fornecedoras de minério de ferro e carvão do mundo.
Em minério de ferro, Vale do Rio Doce (33%), Rio Tinto (20%) e BHP Billiton (15%) dominam quase três quartos do mercado transoceânico mundial, que movimenta mais de 700 milhões de toneladas por ao. Em carvão, Rio Tinto, BHP, Anglo American e Xstrata são as principais fornecedoras.
Com operações em várias partes do mundo - da Ásia e África até América do Norte e Brasil, passando pelo Leste europeu -, essa divisão da maior siderúrgica do mundo poderia ser classificada em quarto lugar no ranking mundial dos produtores de ferro, atrás apenas das três grandes do setor. A produção de minério de ferro na Arcelor Mittal já atinge 70 milhões de toneladas, responsável por 47% do consumo anual do grupo dessa matéria-prima.
Até 2010, com os projetos de expansão em andamento, que deverão adicionar 28 milhões de toneladas, a previsão é chegar a 64%. Segundo informações da siderúrgica, disponível em seu site, suas reservas de minério de ferro espalhadas em uma dezena de países beiram 6 bilhões de toneladas.
A produção de carvão mineral atinge 12 milhões de toneladas e se concentram no Casaquistão. As reservas do insumo usado nos altos-fornos para produzir aço chegam a 1,5 bilhão de toneladas.
A maioria dos ativos estão localizados próximos das usinas de aço, o que representa competitivo custo de logística para o grupo em relação a importações. Apesar disso, a Arcelor Mittal ainda compra muito minério de ferro e carvão no mercado para suprir suas usinas espalhadas por 27 países em quatro continentes. Da Vale do Rio Doce, são cerca de 55 milhões de toneladas.
A idéia de Lakshmi, segundo apurou o Valor com fontes do setor, é criar uma companhia para abrigar todos os ativos de mineração. No Brasil, opera a mina do Andrade, em João Monlevade (MG), que supre os fornos da usina da Belgo instalada na região.
Na visão do empresário, a consolidação do setor de minério de ferro, concentrando 90% em cinco fornecedores, é que permitiu impor aumentos de 71% no ano passado e 19% neste aos preços da matéria-prima. Para o grupo, 'nosso modelo de negócio com verticalização integrada garante competitividade de custo e proteção contra aumentos de preços'.
Viveiros evitou conceder entrevista sobre sua contratação até ser oficializado na nova função. A amigos, no entanto, tem confidenciado que aguarda apenas a autorização de trabalho das autoridades britânicas para poder assumir o cargo na capital londrina na primeira semana de janeiro.
Aos 58 anos, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, o executivo trabalhou quase 30 anos na Vale, onde entrou contratado em 1974 - dois anos depois da conclusão de seu curso - e atuou em diversas áreas até o início de 2005. Desde minério de ferro, pesquisas geológicas, ouro, caulim, metais não ferrosos até operações portuárias. Foi presidente da Docegeo (empresas de pesquisas geológicas da Vale) e seu último cargo na mineradora foi o de diretor do sistema Sul.
Um de seus colegas na Vale - e depois seu chefe na mineradora e na Acesita - foi Wilson Brumer, secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais. 'De fácil relacionamento e aberto para o trabalho de equipe, Viveiros é um dos profissionais mais bem preparados e conhecedor do setor mineral' , afirma o secretário.
Segundo Brumer, o executivo tem a vantagem de ter vivenciado várias áreas na mineração, desde a pesquisa geológica a operações de produção. 'É tecnicamente bem preparado como gestor de ativos'.
De 2001 a 2005, Viveiros comandou o chamado sistema Sul da Vale, o qual compreende todas as minas de ferro em Minas Gerais, cuja produção beirava 100 milhões de toneladas por ano.
Foi nessa época ele que retomou a reavaliação do projeto que culminou na mina Brucutu, de 30 milhões de toneladas, a qual entrou em operação neste ano, segundo relato de fontes do setor.
Sua ida para o maior grupo mundial de aço, com produção prevista de 110 milhões de toneladas este ano e receita na casa de US$ 90 bilhões, é atribuída em parte à sua vivência na Vale, passagem pela indústria siderúrgica e ao trabalho de consultoria que prestou à Arcelor, antes e durante a oferta de aquisição da Mittal. O atual presidente da Arcelor Brasil, José Armando de Figueiredo Campos, teria indicado seu nome a Lakshmi.
Em sua carreira, houve apenas um breve intervalo de pouco mais de dois anos fora da Vale. Em 1994, a convite de Brumer, foi presidir a Eletrometal, usina de aços de alta-liga adquirida pela Acesita e que depois foi incorporada em Aços Villares.
Viveiros, que competiu com candidatos de outros países, não será o único brasileiro na Arcelor Mittal. Antes dele, em setembro, foi contratado Kleber Souza Silva, que será diretor de operações da área de mineração.
Silva, com cerca de 45 anos, trabalhou na MBR, empresa do grupo Caemi, que foi incorporado pela Vale, e chegou a gerente-geral da mina de Carajás. O executivo passou também um tempo na mineradora canadense QCM, ex-controlada da MBR.
Segundo informação de colegas, tem vasta experiência em planejamento de operações de minas.
Uma das atribuições do CEO Mining é levar avante o projeto existente de US$ 1,3 bilhão de investimento para ampliar a produção de minério de ferro da Arcelor Mittal em 28 milhões de toneladas até 2010. As expansões vão ocorrer na Libéria, onde o grupo teve de adequar os planos com a mudança do governo local, no México, Bósnia, Casaquistão e Ucrânia.
Ao mesmo tempo, Viveiros terá o desafio de buscar novas fontes. Uma aquisição à vista está em curso no Senegal.
O Brasil, certamente, não ficará fora da mira de Lakshmi Mittal. Não foi à toa que o empresário dispôs de um bom tempo em prestigiosa agenda para conversar com Viveiros antes de decidir contratá-lo, de acordo com relato de um dos amigos mais próximos do executivo carioca.
O brasileiro, que passou três dias em diversos encontros com vários executivos do alto escalão da Arcelor Mittal, conhece muito bem o mapa mineral do país. Quase que como a palma de sua mão.
Fonte: Valor