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Nota sobre o crédito consignado (Medida Provisória nº 1.292 de março de 2025)

Publicado: 13 Junho, 2025 - 00h00 | Última modificação: 13 Junho, 2025 - 19h40

Com a nova regra para o crédito consignado, não há mais necessidade de os empregadores estabelecerem um convenio com as instituições financeiras. Agora, o trabalhador pode solicitar o crédito consignado diretamente via carteira de trabalho digital. As parcelas do empréstimo serão descontadas na folha do trabalhador mensalmente, por meio do eSocial, observada a margem de 35% do salário.

As instituições financeiras terão acesso aos dados do trabalhador por meio do e-social (remuneração, margem consignável, tempo no emprego, setor de atividade econômica, etc) e assim poderão realizar de forma mais apurada análise de risco e, hipoteticamente, podem criar condições para oferecer taxas de juros menores[1]. Mas não há obrigatoriedade em definir taxas de juros menores do que as atuais, nem limite para os juros praticados.

O empréstimo consignado poderá ser aplicado em todos os vínculos empregatícios ativos no momento da contratação de crédito e em caso de rescisão ou suspensão do contrato de trabalho a consignação será redirecionada para:

I - Outros vínculos de emprego ativos no momento da contratação do crédito, mas inicialmente não alcançados pela consignação;

II - Vínculos empregatícios que surjam posteriormente à contratação da operação de crédito.

Uma novidade da medida é a autorização da portabilidade das operações de crédito consignado entre instituições, ou seja, pessoas que já tenham operações de crédito ativas em linhas de crédito mais caras poderão refinanciar suas dívidas por meio do novo consignado privado, em tese, trocando uma dívida muito mais cara por uma dívida mais barata.

A medida tem potencial de beneficiar 47 milhões de trabalhadores com carteira assinada no Brasil. A estimativa é que, em até quatro anos, cerca de 19 milhões de celetistas optem pela consignação dos salários, o que pode representar mais de R$ 120 bilhões em empréstimos contratados.

O prazo máximo definido pela Portaria do MTE que regulamentou o consignado privado estipulou prazo máximo de 96 meses para o crédito consignado privado e de 144 meses no caso de empresas estatais.

Conforme dito anteriormente, não foi estabelecido teto de juros, mas espera-se que as informações disponibilizadas aos bancos e as garantias fornecidas criem condições para uma redução importante dos juros. O Brasil pratica as mais altas taxas de juros bancárias do mundo. A título de exemplo, o Cheque Especial está em 135% ao ano; os juros do Rotativo do Cartão de Crédito: 446% ao ano e o Crédito Pessoal não consignado: 99,7% ao ano. 

O fato de as parcelas serem debitadas diretamente na folha de pagamento é uma garantia enorme que reduz a inadimplência do crédito consignado. Além disso a MP estabeleceu que a consignação vale para outros vínculos de emprego do trabalhador, inclusive vínculos futuros, o que reduz o risco dos bancos em caso de demissão.

Assim como já estava previsto anteriormente na Lei, até 10% do saldo do FGTS e a multa rescisória podem ser utilizados como garantia nas operações de crédito consignado em caso de demissão. Mas isso não é obrigatório, pois o trabalhador tem autonomia para decidir se quer ou não dar como garantias. Além disso os bancos terão acesso aos dados do trabalhador por meio do E-social o que garante uma análise de crédito mais apurada e, portanto, com menor risco.

Os primeiros resultados foram divulgados pelo Banco Central em 29/05 e indicam aumento substancial na modalidade de crédito consignado. Entre dezembro de 2022 e fevereiro de 2025, a média de concessões de crédito consignado privado foi de R$ 1,6 bilhão ao mês. Em março de 2025 aumentou para R$ 2,2 bilhões; em abril de 2025 foi para R$ 5,6 bilhões, aumento de 260% em relação à média anterior.

Com isso a carteira de crédito total do crédito consignado privado chegou a R$ 45,3 bilhões em abril, aumento de 10% em relação à média de antes do programa Crédito do Trabalhador. A taxa média de juros cobrada nas operações de consignado privado girava em torno de 40% ao ano antes do programa Crédito do Trabalhador e o último dado de abril mostrou uma elevação para 59% ao ano. Com a ausência de teto de juros esse comportamento era esperado na medida em que o crédito se amplia para trabalhadores que antes não tinham acesso (pequenas empresas, setores econômicos com maior rotatividade, etc). Do total, 15 instituições reduziram os juros no consignado privado desde o lançamento do programa crédito do trabalhador. Uma manteve a mesma taxa, enquanto 16 instituições elevaram os juros no consignado privado desde o lançamento do programa crédito do trabalhador.

A inadimplência do consignado privado vinha subindo nos últimos anos provavelmente como reflexo de alta rotatividade. Desde o lançamento do programa a taxa passou a cair, ou seja, os bancos lucram duas vezes, aumentando a taxa de juros (já que não há limite) e com redução da inadimplência.

Considerando todos os elementos apresentados acerca da concessão de crédito consignado aos trabalhadores e trabalhadoras, a CNM/CUT se posiciona no sentido de compreender ser uma medida importante que gera consumo e aumento de giro de capital entre a classe trabalhadora, porém alerta para os seguintes pontos:

  1. O estímulo ao consumo enquanto medida econômica é importante para o aquecimento da indústria e a geração de postos de trabalho, porém deve ser cuidadosa no sentido de não incentivar o endividamento das famílias.
  2. Segundo informações recentes divulgadas, a economia está aquecida e gerando empregos, porém a média salarial, mesmo que em uma tendência de crescimento ainda é considerada baixa, fator que alerta em relação à contração de empréstimos sem limitações de juros;
  3. A atuação sindical nas negociações coletivas é fundamental no sentido de regular os descontos em folha, a fim de garantir que os trabalhadores preervem parte suficiente de seus salários para a manutenção da vida cotidiana.
  4. A decisão sobre a contração de um empréstimo deve ser cuidadosa, analisar percentual de juros, garantias oferecidas, proporção do valor da parcela em relação ao salário e a viabilidade de pagamento do empréstimo.
  5. Por fim, defendemos que todas as homologações que contiverem desconto de empréstimo consignado em folha sejam realizadas no sindicato, a fim de aferir a situação real do trabalhador e orientá-lo sobre o impacto na rescisão.

[1] Respeitados os termos da LGPD.