Bolsa Família não tem correlação com a falta de mão de obra qualificada
Fake news sobre o tema se alimentam do preconceito de que quem recebe o Bolsa Família não quer trabalhar, afirma o diretor de Relações Sindicais do DIEESE, Victor Pagani
Publicado: 09 Janeiro, 2025 - 11h39 | Última modificação: 09 Janeiro, 2025 - 13h48
Escrito por: Redação CNM/CUT*
Os números recordes de queda no desemprego no país divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano passado - a taxa de de desocupação no trimestre móvel encerrado em novembro foi de 6,1%, a menor da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD Contínua), iniciada em 2012 - trouxeram também uma série de notícias falsas impulsionadas por portais ligados à extrema direita no país, na tentativa de desmentir os dados positivos e enganar a população.
Uma das fake news que circulou na internet afirmava que a taxa de desemprego calculada pelo IBGE era falsa pois não levava em consideração o número de “37 milhões de desempregados do Bolsa Família” e “5 milhões de jovens adultos ‘nem-nem’, que não trabalham e nem estudam”. O texto sugeria que os dados oficialmente divulgados estariam sendo manipulados para favorecer o governo Lula.
A informação é enganosa pois a taxa de emprego do IBGE é calculada a partir dos dados da PNAD Contínua, usando o mesmo método desde 2012, portanto mais de uma década antes do atual governo. A metodologia foi definida e recomendada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
“Existe uma versão que circula entre empresários e políticos da extrema direita afirmando que o Bolsa Família é um dos grandes responsáveis pela falta de vontade da juventude de estudar e entrar no mercado do trabalho, o que não corresponde à realidade. O que ocorre é que o salário pago pelas empresas, principalmente no ramo da indústria em vários locais, é quase na linha do salário mínimo. Por isso que a luta da CNM/CUT é para que o piso mínimo da categoria metalúrgica tenha um padrão maior de reajuste”, afirma o presidente da CNM/CUT, Loricardo de Oliveira.
Quase 60% dos beneficiários do Bolsa Família trabalham
Segundo o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), individualmente, 13,4 milhões dos beneficiários do Bolsa Família estão trabalhando. Levando em conta o cálculo por famílias assistidas, 11,9 milhões do total de 20,8 milhões de famílias contempladas pelo programa ao longo do último ano tinham pelo menos uma pessoa empregada. Ou seja, 57,4% delas.
“As fake news sobre o tema se alimentam do preconceito de que quem recebe o Bolsa Família fosse vagabundo que não quer trabalhar”, denuncia o diretor de Relações Sindicais do DIEESE, Victor Pagani.
O Bolsa Família é baseado na renda per capita (por pessoa) mensal de uma família, e pessoas empregadas podem ser contempladas pelo programa se estiverem dentro desse parâmetro. O principal critério para receber o benefício é ter uma renda per capita familiar abaixo de 218 reais por mês. Se um integrante de uma família trabalha e recebe um salário, mas a renda por indivíduo ainda for inferior a 218 reais mensais, a família ainda tem direito ao programa social.
Pagani explica que o que ocorre na realidade é que o Bolsa Família permite, a quem recebe o benefício, sair da condição de miséria absoluta, garantir um mínimo de segurança alimentar e assim exigir condições melhores de trabalho na hora de procurar emprego.
“O beneficiário do Bolsa Família, a partir do momento em que ele tem uma segurança de renda, uma segurança alimentar, ele sai do nível de miséria absoluta, e também deixa de se sujeitar a condições de trabalho degradantes, desumanas ou aviltantes. Então o patrão que quer contratar alguém pagando de forma informal, sem garantia de direitos, pagando valores indignos, ele não consegue mais isso pois, de fato, aquela pessoa que recebe o Bolsa Família, se sofrer assédio, abuso, se não tiver a mínima condição de trabalho e de remuneração, ela não se sujeita mesmo e exigirá condições melhores para fazer determinados serviços”, diz o diretor do DIEESE.
O especialista enxerga que o programa trouxe um efeito civilizatório ao país, o que incomoda vários empregadores.
“O Bolsa Família trouxe também a possibilidade dos jovens poderem se dedicar mais à educação e entrar no mercado de trabalho de forma mais qualificada. Então ao invés desse jovem começar a trabalhar ainda criança ou adolescente, com essa política pública ele pode esperar concluir o ciclo escolar, terminar o ensino médio e buscar um emprego de melhor qualidade”, pontua Pagani.
Salário mínimo como política pública
No que diz respeito ao aumento de piso salarial nas categorias profissionais, o diretor do DIEESE indica que a política permanente de valorização do salário mínimo é mais decisiva que o Bolsa Família.
“Quando a gente tem um processo de valorização real do salário mínimo a gente tem o efeito de empurrar o piso das categorias profissionais organizadas, que pressionam para que os pisos também aumentem. E aí as campanhas de valorização do piso são fundamentais para atrair os jovens para a profissão”, avalia Pagani.
* Com informações do Estadão, Reuters, Terra e Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM)