Duas rodas: Peso do passado freia futuro da Sundown
Publicado: 02 Abril, 2007 - 08h00
Escrito por: CNM CUT
A Brasil & Movimento, fabricante da marca Sundown, teria tudo para modificar o quadro de disputa de um mercado dominado pela Honda. A indústria de motocicletas está entre as que mais crescem no país hoje e a Sundown é um dos concorrentes mais agressivos. Sob a ótica da base industrial, comercial e de marketing, a empresa está pronta para dar um salto. Mas um passado de processos criminais a impede de deslanchar.
Um novo fato pode complicar a situação da empresa. A pedido do Ministério Público, a Polícia Federal do Paraná investigará possível irregularidade em financiamento do BNDES para a Brasil & Movimento. Enquanto isso, os uruguaios Isidoro e Rolando Rozenblum, filho e neto do controlador da empresa, Jaime Rozenblum, deixaram a prisão, depois de detidos por dívidas fiscais, e estão em um hospital em Curitiba, sob escolta policial. No Uruguai, ninguém fornece informações sobre Jaime Rozenblum, de 96 anos de idade.
O crescimento nas vendas de um produto bem aceito no mercado começou a forçar uma expansão industrial em Manaus, onde está a fábrica da Sundown. Em um ano, as vendas cresceram 79,6%. Para 2007, a equipe de produção já está mobilizada para fazer o volume crescer pelo menos mais 70%.
No ano passado, a Brasil & Movimento começou a publicar seus balanços, dentro do processo para abertura de capital que acabou não sendo concluído. O primeiro balanço anual mostrou aumento de 42,6% na receita (R$ 340,5 milhões), em boa parte impulsionado pelos negócios com motos, e lucro bruto de R$ 173,8 milhões.
Com um capital de giro de R$ 34,1 milhões e um endividamento de curto prazo de R$ 81,9 milhões (70,6% maior do que no exercício anterior), este seria o momento ideal para a empresa por em prática o plano de lançar ações no mercado.
Com mais recursos, a empresa poderia crescer com mais força. O dinheiro poderia vir do mercado, mas o plano de lançamento de ações foi adiado. Ou ainda de compradores do empreendimento. A própria direção da empresa admite sondagens e o crescimento do setor de motocicletas tem atraído novos grupos interessados em investir na produção desses veículos no Brasil. Mas nenhum negócio estaria perto de ser fechado.
No comando da empresa desde 2003, quando a Brasil & Movimento deixou de fabricar apenas bicicletas para entrar também no segmento de motos, está Antônio Carlos Romanoski, que veio da indústria de linha branca e hoje é um executivo de prestígio no mercado, premiado por entidades como a associação dos dirigentes de vendas (ADVB). Segundo ele, a empresa ainda não lançou os papéis porque esperava pela recuperação do mercado acionário.
Há pouco mais de seis meses, a empresa teve os bens bloqueados pela Justiça de Curitiba, cidade onde ficava a antiga fábrica de bicicletas Sundown, comprada pela Brasil & Movimento. Romanoski diz que há um engano de interpretação porque a empresa de hoje não tem relação com a que fez surgirem os processos na Justiça e as prisões.
O executivo diz que as notícias negativas não são absorvidas pelos compradores das motos e, portanto, não perturbam as vendas. Mas ele admite que atrapalham o relacionamento da empresa com as instituições bancárias que podem liberar créditos para financiamentos. Romanoski diz se arrepender de ter mantido como marca o nome da antiga fabricante que levou aos problemas com a polícia.
Mas agora é tarde. Sundown já é um nome consagrado no mercado e as ações de divulgação da marca crescem a cada dia, com a inclusão de novos concessionários. E se em Curitiba, o nome da empresa com freqüência é vinculado a problemas com a polícia, na Zona Franca de Manaus a linha de montagem flui em ritmo acelerado.
Espaço é um dos problemas que mais têm tirado o sono de Carlos Hubner, o inquieto gerente industrial da fábrica instalada no coração do pólo industrial de Manaus.
O crescimento dos volumes de produção obrigam a Sundown a aumentar o número de processos industriais em Manaus. Trata-se de uma exigência da Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus) para que qualquer empresa continue a receber incentivos fiscais.
A fábrica funciona basicamente com a montagem de peças importadas de produtores de motocicletas da China. Mas é uma linha de montagem que tende a ganhar cada vez mais um formato de fábrica porque, pouco a pouco, tem de cumprir as exigências do chamado PPB (Processo Produtivo Básico), que rege o sistema industrial na Zona Franca. E a Suframa fiscaliza o cumprimento das regras com rigor, segundo não apenas a própria autarquia como as demais empresas instaladas no pólo.
Recentemente, Hubner foi obrigado a ocupar uma área do prédio onde são produzidas as bicicletas para instalar a montagem de motores, uma nova exigência do PPB. E até o final do ano, o gerente terá que encontrar espaço para a montagem de chassis. Para isso, estão em pleno andamento obras de ampliação, que desativaram um campo de futebol para dar lugar ao aumento do prédio de motos, que passará de 2,5 mil metros para 10,5 mil metros quadrados, ficando, assim, do mesmo tamanho das instalações dedicadas às bicicletas.
As obras, que incluem espaço para acomodar as dezenas dos contêineres vindos da China que diariamente se acumulam num terreno de terra, estão sendo feitas com recursos de financiamento.
Com 528 funcionários, a fábrica de motos Sundown trabalha com um mês de estoque de componentes importados e dois a três dias de peças nacionais (itens como pneus, freios e peças de iluminação vindos de São Paulo).
Foi de Romanoski a idéia de enviar doze engenheiros para a China. O grupo, que ocupa espaço de 8 mil m2 cedido pelo parceiro chinês em Jinan, cidade ao sul do país, cuidam da pré-montagem dos contêineres e transmitem para o fabricante chinês informações do que a empresa precisa no Brasil.
'Uma marca que parecia nome de bronzeador e estava envolvida com a polícia é hoje vista como um produto inovador, voltado ao consumidor de baixa renda, que representa a maior parte do nosso mercado no país', diz Romanoski.
Fonte: Valor