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Grupo chinês compra Kasinski e tem o desafio de perpetuar a história da marca

Publicado: 12 Agosto, 2009 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

Você conseguiria contar a história de uma empresa de origem familiar sem resgatar os primeiros passos de seu fundador? Tarefa difícil. As biografias e as trajetórias empresariais naturalmente se misturam ao longo dos anos. É o que acontece com Abraham Kasinsky, um dos mais emblemáticos personagens do meio empresarial brasileiro. Seria impossível falar sobre a venda da fabricante de motocicletas Kasinski (com "i") para a chinesa CR Zongshen, sem relembrar de seu criador.

A história de um dos maiores empresários do Brasil - que adotou o apelido Abrão por ser mais fácil de pronunciar e a terminação y aos 80 anos por causa da numerologia, mas nos documentos dele e de seu pai o sobrenome aparecia das duas formas - começou com uma loja de autopeças da família, transformada em grande rede, que abandonou em 1951, aos 33 anos, para fundar a fábrica de componentes automotivos Cofap, cujo carro-chefe era o amortecedor. Para quem não lembra da marca, fica mais fácil trazer a recordação da premiada campanha publicitária de Washington Olivetto em que um cachorro da raça dachshund, apelidado posteriormente de "Cofapinho", fazia manobras audaciosas de capacete com um carrinho pelas curvas de um parque.

A personalidade e o pulso fortes de Abraham Kasinsky fizeram do Grupo Cofap o maior da América Latina no setor de autopeças, com 20 empresas que exportavam para 92 países. Também construiu fábrica na Europa e nos Estados Unidos. Porém, o negócio de sucesso enfraqueceu quando Kasinsky perdeu parte de suas ações devido a brigas com ex-mulher e filhos. Além dos conflitos, a situação foi agravada pelo início da globalização e, em 11 de julho de 1997, data em que completaria 80 anos, assistiu a seu império ser vendido aos gigantes grupos italiano Magneti Marelli e alemão Mahle.

Apesar da desestruturação de sua vida, Kasinsky não olhou para trás e, aos 80 anos, recomeçou tudo com foco em uma antiga paixão: a motocicleta. Assim, em 1999, inaugurou a Kasinski Fabricadora de Veículos. Mais uma vez, Washington Olivetto entra em cena e coloca o "seu Abrão" sobre uma moto em um globo da morte, aos 85 anos, para fincar a marca na cabeça do brasileiro. Dez anos depois, em meados de julho deste ano, a empresa é vendida para o grupo chinês Zongshen, que formou a CR Zongshen.

Abraham Kasinsky não dá mais entrevistas, no entanto, o presidente-executivo da CR Zongshen, Claudio Rosa, conta ao G1 como foi a aquisição da empresa e qual será o futuro da marca, talvez a última paixão do empresário de 92 anos feita "com peito e caneta Parker", como afirma no livro biográfico "Kasinsky - um gênio movido a paixão. A história do fundador da Cofap", escrito por Maria Lúcia Doretto.

Existe grande responsabilidade em abraçar uma marca como a Kasinski, devido à história do criador e "da criatura". Como a CR Zongshen continuará o sonho de Abraham Kasinsky?

O principal pedido do senhor Kasinsky foi perpetuar a marca dele, como forma de manter viva essa história. Nosso plano é investir US$ 80 milhões no mercado brasileiro, com a implantação ainda este ano de uma fábrica na Zona Franca de Manaus de 100 mil m², com capacidade para produzir 90 mil unidades por ano em um turno de trabalho. Esse volume irá ser somado as 20 mil unidades produzidas pela Kasinski, assim, a capacidade total chegará a 110 mil unidades. A empresa já possui 150 funcionários, então agregaremos mais 100 pessoas até o final de 2009. Além disso, lançaremos sete novos modelos de até 200 cc ainda este ano.

Como surgiu o interesse do grupo Zongshen pela fabricante brasileira de motos?

A empresa CR Zongshen possui 50% de capital nacional e 50% de capital chinês. A parte chinesa faz 2 milhões de motos por ano e 4 milhões de motores para motocicletas. O Grupo Zongshen é bastante forte na China. Como estava interessado no mercado brasileiro, fizemos esta parceria. Nosso primeiro desafio foi justamente achar um parceiro que pudesse aumentar nosso portfólio com motos de mais alta cilindragem, acima de 200 c (a Zongshen foca sua produção em motos menores). O segundo ponto era a questão da marca. Nesse sentido, a gente começou a prospectar dentro do país quem pudesse ter essa sinergia. E a marca Kasinski tem dez anos de mercado, 100 revendedores e motos de 250cc 650cc que vêm da Coreia do Sul. Por sua vez, o seu Abraham Kasinsky, que já está com 92 anos, buscava um parceiro tecnológico para perpetuar a fábrica e a marca. Então, o que ia ser parceria virou processo de aquisição, que há 15 dias foi consolidado.

Quando o senhor ressalta a procura da Kasinski por um parceiro tecnológico é para competir com grandes nomes como Honda e Yamaha?

Daqui para frente a disputa do mercado de motocicletas vai ser uma briga mais de cachorro grande. Por isso, os investimentos em tecnologia são fundamentais. Encaramos mundialmente como concorrentes Honda, Yamaha, Kawasaki e Suzuki.

Para o mercado brasileiro, tecnologia significa injeção eletrônica e motor bicombustível. A Kasinski lançará algum modelo flex?

Acabamos de lançar a linha 2010 da Comet 250 cc e 650 cc e Mirage 250 cc e 650 cc, todas com injeção eletrônica, adequadas ao Promot 3 (terceira fase da lei que limita o nível de emissões das motocicletas). Em outubro, no Salão de Duas Rodas apresentaremos os sete modelos, de 100 cc a 200 cc, e uma motoneta elétrica de 2 mil watts, com tecnologia canadense, pois a Zongshen tem uma subsidiária no Canadá especializada na área elétrica e de célula de hidrogênio. Já a moto flex Kasinski só chegará no ano que vem.

Com o aumento do portfólio de produtos, qual é a projeção de crescimento para o mercado brasileiro?

Nossa meta é passar de menos de 1% de participação no mercado nacional para 5% em três anos, que em volume de vendas chegará próximo a nossa capacidade de produção. Mas além desses produtos, vamos aumentar a importação de motos da Coreia. Com a fabricação de sete produtos aqui, mais cinco novos importados chegaremos a 12 modelos disponíveis de 100 cc a 650 cc. Além disso, os revendedores estão aí e nosso plano é definir 50 novos no Brasil inteiro, chegando a 150 revendedores.

Então, a estratégia é aproveitar a retomada do mercado prevista para 2010 e conquistar novos clientes?

Sobre a crise, 2009 está perdido, não conseguiremos reverter a situação. Acredito que 2010 será bem diferente. Mas não é a tendência de recuperação que justifica o investimento. O Brasil faz parte de nossa estratégia global de ser um dos grandes players do mercado de motos. Diferentemente de outros que são montadores, nós somos fabricantes de motos, então a nossa estratégia é de médio e longo prazo. Tanto é que temos vários fornecedores nacionais e traremos fabricantes de motopeças chineses para integrar nosso complexo industrial. O proprietário do grupo sempre fala que daqui 20 anos ele estará ainda fazendo motos. O que é bem diferente de muitos pequenos montadores ou importadores, que não são do ramo e desistiram do Brasil no primeiro sinal de crise. Viemos para ficar e continuaremos com o sonho do seu Abrão.

Fonte: G1