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Mittal leva brasileiro para comandar área de matérias-primas

Publicado: 08 Dezembro, 2006 - 08h00

Escrito por: CNM CUT

Um geólogo carioca radicado em Minas e que construiu quase toda sua carreira na Vale do Rio Doce irá comandar, de Londres, a 'quarta maior mineradora de ferro do mundo'. A empresa não é conhecida, não está listada em bolsa nem tem um nome específico, mas carrega o pedigree de um dos principais conglomerados mundiais. A partir de janeiro, José Francisco Martins Viveiros será o principal executivo (CEO Mining) da área de minério de ferro e carvão da Arcelor Mittal, gigante do aço formatada este ano pelo empresário indiano Lakshmi Mittal.

Viveiros, cujo contratação será oficializada nos próximos dias, tem pela frente a missão de ampliar esse negócio, considerado estratégico no suprimento das usinas do grupo. O objetivo é reforçar a auto-suficiência para deixar o grupo o menos dependente possível das fornecedoras de minério de ferro e carvão do mundo.

Em minério de ferro, Vale do Rio Doce (33%), Rio Tinto (20%) e BHP Billiton (15%) dominam quase três quartos do mercado transoceânico mundial, que movimenta mais de 700 milhões de toneladas por ao. Em carvão, Rio Tinto, BHP, Anglo American e Xstrata são as principais fornecedoras.

Com operações em várias partes do mundo - da Ásia e África até América do Norte e Brasil, passando pelo Leste europeu -, essa divisão da maior siderúrgica do mundo poderia ser classificada em quarto lugar no ranking mundial dos produtores de ferro, atrás apenas das três grandes do setor.

A produção de minério de ferro na Arcelor Mittal já atinge 70 milhões de toneladas, responsável por 47% do consumo anual do grupo dessa matéria-prima. Até 2010, com os projetos de expansão em andamento, que deverão adicionar 28 milhões de toneladas, a previsão é chegar a 64%. Segundo informações da siderúrgica, disponível em seu site, suas reservas de minério de ferro espalhadas em uma dezena de países beiram 6 bilhões de toneladas.

A produção de carvão mineral atinge 12 milhões de toneladas e se concentram no Casaquistão. As reservas do insumo usado nos altos-fornos para produzir aço chegam a 1,5 bilhão de toneladas.

A maioria dos ativos estão localizados próximos das usinas de aço, o que representa competitivo custo de logística para o grupo em relação a importações.

Apesar disso, a Arcelor Mittal ainda compra muito minério de ferro e carvão no mercado para suprir suas usinas espalhadas por 27 países em quatro continentes. Da Vale do Rio Doce, são cerca de 55 milhões de toneladas.

A idéia de Lakshmi, segundo apurou o Valor com fontes do setor, é criar uma companhia para abrigar todos os ativos de mineração. No Brasil, opera a mina do Andrade, em João Monlevade (MG), que supre os fornos da usina da Belgo instalada na região.

Na visão do empresário, a consolidação do setor de minério de ferro, concentrando 90% em cinco fornecedores, é que permitiu impor aumentos de 71% no ano passado e 19% neste aos preços da matéria-prima. Para o grupo, 'nosso modelo de negócio com verticalização integrada garante competitividade de custo e proteção contra aumentos de preços'.

Viveiros evitou conceder entrevista sobre sua contratação até ser oficializado na nova função. A amigos, no entanto, tem confidenciado que aguarda apenas a autorização de trabalho das autoridades britânicas para poder assumir o cargo na capital londrina na primeira semana de janeiro.

Aos 58 anos, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, o executivo trabalhou quase 30 anos na Vale, onde entrou contratado em 1974 - dois anos depois da conclusão de seu curso - e atuou em diversas áreas até o início de 2005. Desde minério de ferro, pesquisas geológicas, ouro, caulim, metais não ferrosos até operações portuárias. Foi presidente da Docegeo (empresas de pesquisas geológicas da Vale) e seu último cargo na mineradora foi o de diretor do sistema Sul.

Um de seus colegas na Vale - e depois seu chefe na mineradora e na Acesita - foi Wilson Brumer, secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais. 'De fácil relacionamento e aberto para o trabalho de equipe, Viveiros é um dos profissionais mais bem preparados e conhecedor do setor mineral', afirma o secretário. Segundo Brumer, o executivo tem a vantagem de ter vivenciado várias áreas na mineração, desde a pesquisa geológica a operações de produção. 'É tecnicamente bem preparado como gestor de ativos.'

De 2001 a 2005, Viveiros comandou o chamado sistema Sul da Vale, o qual compreende todas as minas de ferro em Minas Gerais, cuja produção beirava 100 milhões de toneladas por ano. Foi nessa época ele que retomou a reavaliação do projeto que culminou na mina Brucutu, de 30 milhões de toneladas, a qual entrou em operação neste ano, segundo relato de fontes do setor.

Sua ida para o maior grupo mundial de aço, com produção prevista de 110 milhões de toneladas este ano e receita na casa de US$ 90 bilhões, é atribuída em parte à sua vivência na Vale, passagem pela indústria siderúrgica e ao trabalho de consultoria que prestou à Arcelor, antes e durante a oferta de aquisição da Mittal. O atual presidente da Arcelor Brasil, José Armando de Figueiredo Campos, teria indicado seu nome a Lakshmi.

Em sua carreira, houve apenas um breve intervalo de pouco mais de dois anos fora da Vale. Em 1994, a convite de Brumer, foi presidir a Eletrometal, usina de aços de alta-liga adquirida pela Acesita e que depois foi incorporada em Aços Villares.

Viveiros, que competiu com candidatos de outros países, não será o único brasileiro na Arcelor Mittal. Antes dele, em setembro, foi contratado Kleber Souza Silva, que será diretor de operações da área de mineração. Silva, com cerca de 45 anos, trabalhou na MBR, empresa do grupo Caemi, que foi incorporado pela Vale, e chegou a gerente-geral da mina de Carajás.

O executivo passou também um tempo na mineradora canadense QCM, ex-controlada da MBR. Segundo informação de colegas, tem vasta experiência em planejamento de operações de minas.

Uma das atribuições do CEO Mining é levar avante o projeto existente de US$ 1,3 bilhão de investimento para ampliar a produção de minério de ferro da Arcelor Mittal em 28 milhões de toneladas até 2010. As expansões vão ocorrer na Libéria, onde o grupo teve de adequar os planos com a mudança do governo local, no México, Bósnia, Casaquistão e Ucrânia. Ao mesmo tempo, Viveiros terá o desafio de buscar novas fontes. Uma aquisição à vista está em curso no Senegal.

O Brasil, certamente, não ficará fora da mira de Lakshmi Mittal. Não foi à toa que o empresário dispôs de um bom tempo em prestigiosa agenda para conversar com Viveiros antes de decidir contratá-lo, de acordo com relato de um dos amigos mais próximos do executivo carioca. O brasileiro, que passou três dias em diversos encontros com vários executivos do alto escalão da Arcelor Mittal, conhece muito bem o mapa mineral do país. Quase que como a palma de sua mão.

Ação da Arcelor Brasil atinge recorde na Bovespa

As ações da Arcelor Brasil atingiram ontem seu maior valor histórico, de R$ 41,94, na bolsa paulista, embaladas pela informação divulgada pelo jornal francês 'La Tribune', de que a Arcelor Mittal teria feito um acordo e aumentado em 1 bilhão de euros o valor da oferta pública de aquisição de ações (OPA) dos minoritários da controlada brasileira. Os minoritários respondem por 34% do capital da empresa. O papel da controlada brasileira acumula no mês alta de 4,85% e, no ano, de 54,04%.

A multinacional do aço teria elevado de 2,6 bilhões de euros para 3,7 bilhões de euros o total a ser pago pela oferta em dinheiro aos acionistas brasileiros. Este aumento corresponde a uma alta no preço fixado na proposta original de OPA, enviada à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de 41%. Ou seja, um salto de 12,1181 euros, valor correspondente a R$ 34,53, conforme a cotação de ontem do euro, de R$ 2,85) para 17,08 euros , ou R$ 48,67 por ação.

Este novo preço fica bem próximo dos R$ 51 pedidos pelos acionistas minoritários, com base no prêmio de 82% sobre o valor da ação pago pela Mittal aos acionistas da Arcelor no processo de aquisição da siderúrgica baseada em Luxemburgo.

A multinacional do aço, que se tornou líder absoluta no mundo com a aquisição, divulgou ontem um comunicado desmentindo que tenha alterado o valor da sua oferta como relatou o jornal francês. 'Nada mudou desde que fizemos nossa oferta aos acionistas minoritários da Arcelor Brasil. Não é verdade que vamos modificar o valor da oferta aos minoritários brasileiros. Nossa oferta se mantém sem mudança aos R$ 32,79 oferecidos. Esse preço foi calculado com base no Ebitda (lajida - lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da Arcelor Brasil usando a mesma metodologia que a Mittal Steel usou para avaliar a Arcelor', informou a nota.

As notícias mexeram com os nervos dos minoritários da Arcelor Brasil. Esta semana representantes da multinacional do aço visitaram a CVM e procuraram acionistas brasileiros para conversar, mas não propuseram mudanças na oferta, segundo apurou o Valor. O que se pode obter dessas conversas é que a Arcelor Mittal se dispõe a acatar a decisão do órgão em relação a sua proposta de OPA e desistiu de recorrer à Justiça. A gigante siderúrgica deve responder até o dia 11 de janeiro os esclarecimentos pedidos pela CVM sobre sua proposta de registro de oferta (OPA), os quais lhe foram encaminhados no dia 27 de novembro.

'A bola está com a CVM', disse um minoritário que preferiu não ser identificado. A fonte destacou que enquanto a CVM não se pronunciar não há nenhuma possibilidade de a Arcelor Mittal fazer qualquer acordo com os acionistas minoritários.

O que pode acontecer, fato que gerou as notícias que circularam ontem, é que a Arcelor Mittal, ante a possibilidade de que a CVM poderá obrigá-la a rever sua metodologia de cálculo do preço fixado para a oferta - a denominada 'metodologia do EBTIDA proporcional' - , já conta com uma carta na manga. Ou, como avalia uma fonte, disporia de uma proposta de aumento do preço da oferta aos minoritários, reproduzindo o comportamento da Mittal com a Arcelor.

Dependendo do valor da ação na OPA, não está descartada a possibilidade de os minoritários optarem por permanecer na empresa (Arcelor Brasil). Mas, esta não é uma discussão que se coloca agora, como esclareceu um interlocutor envolvido no negócio. 'Vamos esperar a oferta da Mittal para saber se saímos ou se ficamos. A gente contempla se vai vender ou se vai ficar, se sai vendendo a ação a R$ 48 ou se fica, acreditando no futuro promissor da empresa. A oferta não é para fechar capital e o novo mercado é uma proteção', afirmou a fonte.

Para permanecerem na companhia, no momento maior produtora de aço no Brasil, os acionistas exigiriam garantias da controladora, tais como o tag along, com compromisso de entrada da Arcelor Brasil no Novo Mercado, e mais o direito de veto às aquisições da Arcelor Mittal no exterior.

Fonte: Valor