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Taxação do aço importado no Brasil: o que os trabalhadores têm a ver com isso?

Publicado: 16 Novembro, 2023 - 00h00 | Última modificação: 16 Novembro, 2023 - 15h29

Nós, metalúrgicos da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM/CUT) e Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos da Força Sindical (CNTM), estamos acompanhando com cuidado e responsabilidade as últimas notícias sobre o imposto de importação de determinados produtos siderúrgicos, fundamentais para a produção industrial no Brasil.

Recentemente o Comitê Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex) antecipou o fim da redução de 10% do imposto de importação sobre 12 itens siderúrgicos. A decisão atual está válida desde 1º de outubro e a justificativa da medida, segundo o vice-presidente e Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), Geraldo Alckmin, “reflete o compromisso de fortalecer a indústria nacional do aço. A exclusão desses 12 produtos siderúrgicos da redução da tarifa de importação vai garantir condições mais justas e competitivas para os fabricantes nacionais”.

Segundo dados do próprio MDIC , comparando o primeiro semestre de 2023 com igual período de 2022, as importações de aço aumentaram substancialmente, registrando variações de até 714%, produtos siderúrgicos importados, sobretudo da China, chegam ao mercado brasileiro com preços desleais, fragilizando os produtos siderúrgicos produzidos no Brasil. Os itens que voltam à aplicação integral da Tarifa Externa Comum (TEC) são:

• Bobinas Grossas;
• Bobinas a Quente;
• Bobina a Frio;
• Chapas Galvanizadas;
• Chapas Revestidas de Alumínio-Zinco;
• Fios-máquina;
• Barra Inox a Frio;
• Tubos sem costura.

Por outro lado, setores industriais brasileiros que utilizam o aço, defendem a manutenção da redução da tarifa de importação dos itens mencionados, com a justificativa de que os preços do aço produzido no país aumentariam 15% em relação ao produto importado, prejudicando a cadeia produtiva que utiliza aço como matéria prima em sua produção.

Relevância do Setor Siderúrgico para o Brasil

Consideramos o segmento siderúrgico como estratégico para o desenvolvimento da indústria no país, por oferecer produtos essenciais da cadeia produtiva de diversos setores econômicos. A siderurgia possui um parque fabril relevante no país, com 35 usinas distribuídas por 10 estados brasileiros, enquanto suas minas e fábricas de produtos acabados pertencem a 17 empresas privadas, controladas por treze grupos empresariais. O Brasil está na 9ª posição do ranking mundial de produção do aço, com capacidade instalada de 51 milhões de toneladas de aço bruto por ano, mas com uma produção de apenas 34 milhões de toneladas em 2022. A China segue em 1º lugar, com produção anual de 1 bilhão de toneladas de aço bruto.

Dentre os setores de baixa e média-baixa tecnologia, a siderurgia é um segmento adensado e o consumo aparente de produtos siderúrgicos foi de 23,5 milhões de toneladas, sendo 20,3 milhões em vendas internas e 3,2 milhões em importações, ou seja, as importações correspondem a 14% do total do consumo aparente, em 2022.

A siderurgia constitui o maior segmento empregador do ramo metalúrgico, com cerca de 635 mil trabalhadores diretos, sendo 32% empregados nas Usinas siderúrgicas, 63% empregados na fabricação de metalurgia básica e 4% na produção de ferro-gusa e ferro-ligas, mas possui remuneração média entre as duas mais baixas na metalurgia [segundo dados da Rais 2021].

No que se refere aos acidentes no ramo metalúrgico, a siderurgia apresenta maior incidência, com 37,8% de toda a categoria. Das mortes totais no ramo, a siderurgia também lidera, com 32,4% de participação, segundo o Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (AEAT), publicado pelo Ministério da Previdência Social.

Conforme mencionado acima e expresso em outros documentos, como o Plano Brasil 10+ [entregue tanto para o MDIC, quanto para as entidades empresariais do setor industrial], consideramos a produção siderúrgica extremamente relevante para o processo de retomada da indústria nacional, cujo objetivo seja garantir a geração de empregos decentes, ao mesmo tempo que promove a melhoria de vida da população brasileira.

Os trabalhadores(as) do setor siderúrgico e demais setores, representados pelas entidades que subscrevem esse documento, defendem o fortalecimento da indústria de transformação nacional no curto, médio e longo prazo e, nesse sentido, um conjunto de medidas sistêmicas devem ser abordadas, inclusive a questão de tarifas, mas não só, que visem equacionar os problemas não apenas do setor do aço, mas dos outros ramos da indústria de transformação, sobretudo daqueles que elevam a produtividade e competitividade da indústria nacional. Contudo, é fundamental haver contrapartidas que garantam, à sociedade e aos trabalhadores, mecanismos concretos que estabeleçam metas, acompanhamento, geração e garantia dos empregos decentes, com melhorias substanciais nas condições e relações de trabalho, bem como eliminação das práticas antissindicais.

Expressamos no Plano Indústria 10+, a prioridade na mudança no perfil das indústrias visando sua descarbonização, com menor impacto socioambiental. Essa transição deve ser feita de maneira justa aos trabalhadores, contribuindo para que os diferentes segmentos industriais tenham avanços nas negociações coletivas e melhorias nas condições de trabalho.

Mudar de patamar tecnológico é um caminho urgente e necessário, incorporando a promoção da indústria siderúrgica verde, aumentando a eficiência da produção, através de políticas de apoio à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação com foco em novas tecnologias na produção do aço, eliminando etapas, reduzindo o impacto ambiental, estabelecendo metas e compromissos para cada financiamento aprovado, bem como promover a logística reversa e a indústria de reciclagem em escala compatível com o consumo nacional.

O Brasil ainda possui um baixo consumo per capita de aço bruto (120kg/habitante) em comparação aos demais países do BRICS [BRICS refere-se aos países: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O Brasil possui um consumo de 120Kg/habitante; Rússia 288,3Kg/hab; Índia teve 81,1 Kg/hab; China com 645,8 Kg/hab e África do Sul com 73,1 Kg/hab. Para detalhes clique aqui], ficando acima somente de Índia e África do Sul. Um caminho para melhorar o desempenho setorial seria aumentar o consumo per capita do aço, a partir da ampliação da participação da manufatura na economia, bem como através de maior participação de setores demandantes do aço, a exemplo dos setores automotivo, da construção civil, máquinas e equipamentos e naval, dentre outros. Para tanto, a política industrial deve estar articulada setorialmente, de forma que a produção nacional seja capaz de atender as necessidades dos setores demandantes e, para além disso, que a demanda exista.

Nesse sentido, além dos pontos destacados anteriormente, consideramos fundamental a criação de uma mesa nacional tripartite da Siderurgia para articular a produção siderúrgica com os principais setores consumidores de aço, garantindo tanto a ampliação da densidade produtiva, quanto a construção de um contrato coletivo nacional de trabalho, visando garantir condições de trabalho e direitos básicos em escala nacional, considerando temas como formação profissional, piso nacional, organização no local de trabalho, liberdade sindical e saúde e segurança no trabalho, este último em função do elevado índice de acidentes.